HA60 – PIBEXA 2024

tempuh carvalho

HA60 foi um experimento de artes integradas, realizado por Padmateo Menezes e Tempuh Carvalho, que teve o corpo como elemento central de investigação envolvendo linguagens como dança, performance e artes visuais. Na obra, duas pessoas trans não binárias ficcionaram um grande experimento laboratorial, onde seus corpos foram auto testados entre suas fragilidades e seus limites, para comprovações científicas mediante o status quo e imaginário social da binariedade. As ações, movimentos e gestos criados seguiram na obra como auto ironia e deboche dos lugares em que nos inseriram e os que hackeamos.

Nós, pessoas trans com um sistema sexual uterino, somos constantemente questionades em consultas médicas sobre o desejo ou não de congelamento de óvulos, para uma possível gestação. Reflexo de uma hetero-cisgeneridade compulsória, que acredita na incerteza sobre a transição de gênero, somada à possibilidade da destransição futura, presente no discurso médico e atrelada ao [des]cuidado com nossos corpos. Os experimentos laboratoriais perpassaram os pelos corpóreos; o direito à opacidade; o contraste
entre luz e sombra; o que é visto e está posto, o que é invisível e está por ser descoberto, caminhando para uma especulação em que o gênero seria implodido.

HA60 é uma denominação da CID 11 (Classificação Internacional de Doenças), que relata incongruência de gênero na infância, na adolescência e na vida adulta, diagnosticando a transgeneridade em termos médicos, assim como a delimitando em um único espaço de validação – a doença. Nesse sentido, esse processo foi de extrema importância para nossa auto investigação cênica, gestual, comportamental e epistêmica. Fomos cientistas e cobaias de nossa própria experiência laboratorial, não havendo conclusão sólida, fechada. Hormonizamos um frango em um laboratório improvisado a céu aberto.

Tivemos três meses voltados para estruturação e levantamento de cena e, por se tratar de uma linguagem que borra a fronteira entre métodos e suportes artísticos, espectadores e artistas, optamos por compartilhar a cena ocupando uma via de passagem próxima ao PAF III, no campus Ondina, como parte da programação de intervenções artísticas no Congresso UFBA 2024. Ao finalizarmos este experimento, fomos tomades pela sensação de fracasso. Entretanto, alterando sua semântica, entendemos que fracassamos o processo neoliberal do tempo, da criação, da necessidade de um produto lapidado, um espetáculo pronto, enquanto nossa urgência foi e continua sendo a experimentação, sobretudo de nossos corpos, vidas e experiências de transformação. Portanto, o projeto foi essencialmente pensado e realizado como um laboratório de investigação de nossas próprias identidades não binárias, ao fazermos de nossas imagens complexos de intimidade.

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